Sunday, 7 November 2010
Billy Blanco
BILLY BLANCO (William Blanco Trindade) é um dos dos compositores mais importantes da MPB. Nasceu em Belém do Pará em 1924. Desde os dez anos já praticava poesia, fazendo suas redações todas em versos, sendo sempre nota dez em português. Interessou-se pela música desde cedo, fazendo inicialmente paródias, com letras diferentes em músicas conhecidas.
Escutava as estações de rádio do Rio de Janeiro, num rádio chamado Galena de um vizinho seu. Era uma agulha de costura comum, que sintonizava as estações percorrendo um cristal de rocha e que transmitia à fone de ouvido. Naquela oportunidade, tomou conhecimento da música de Noel Rosa e seu parceiro, o maestro Vadico (Oswaldo Gogliano), se impressionou com a qualidade da letra de Noel, e a música de Vadico. Daí a sua preocupação, ao escrever seus sambas, com a elaboração das letras, os assuntos e a composição das melodias.
Na juventude já participava de shows nos quartéis, hospitais e escolas, época em que os compositores e músicos iniciantes eram chamados “amador marrom” porque já recebiam algum dinheiro por suas apresentações. Depois de passar pelos colégios Moderno, Nazaré e Ginásio Paes de Carvalho, ingressou na Escola de Engenharia do Pará, hoje Universidade Federal. Na segunda série de engenharia civil, foi para São Paulo na década de 40, em busca de arquitetura que não tinha na Escola do Pará, ingressando no então Mackenzie College, universidade americana tradicional.
Ao passar para o quarto ano, foi para o Rio de Janeiro e conheceu o arquiteto Sérgio Bernardes de quem se tornou amigo. Sérgio conseguiu matriculá-lo na Faculdade de Arquitetura e Belas Artes do Rio de Janeiro e Billy se mudou definitivamente para o Rio, indo trabalhar como desenhista nos escritórios de Sérgio Bernardes até se formar arquiteto em 1950.
Sua vinda para o Rio, lhe proporcionou gravar as primeiras músicas, o que não tinha conseguido em São Paulo. Daí por diante, freqüentando o meio musical, conheceu Dolores Duran que o apresentou aos vários cartazes da década de 50, como Lúcio Alves, Dick Farney, Silvio Caldas, Isaura Garcia, Elizete Cardoso, Radamés Gnattalli, João Gilberto e a dois compositores famosos – Armando Cavalcanti e Klécius Caldas, oficiais do exército que muito ajudaram e orientaram lançando Billy Blanco no mercado musical.
Suas primeiras composições, já profissionais, foram lançadas, cantadas e gravadas por Leda Barbosa, Dolores Duran, Mary Gonçalves, Neusa Maria, Linda Batista e outros. Seu primeiro sucesso foi “Estatutos da Gafieira”, cantado por Inesita Barroso e regravados por vários cantores.
Conheceu Aloysio de Oliveira, produtor e músico que “obrigou” Billy a cantar no seu primeiro disco para o selo Elenco (da gravadora Odeon). Em seguida jogou Billy em vários shows de boite, teatro e casas de espetáculos.
Rara e histórica coincidência, Billy ao chegar no quarto ano de arquitetura da Universidade do Brasil, ficou sabendo que deveria estar ali como colega de turma, um rapaz que também era compositor chamado Antonio Carlos Jobim, que havia trancado a matrícula ainda no primeiro ano. Nessa ocasião Jobim pedira ao padrasto – Dr. Celso Frota Pessoa – que alugasse um piano para ele, o que foi atendido, resultando no início do maior compositor do Brasil. Billy perguntou onde encontraria o ex-quase colega. Tom tocava na noite no bar “Posto Cinco” na Av. Atlântica e foi lá conhecê-lo.
Tom e Billy tornaram-se parceiros em várias canções. Freqüentavam, com Radamés e Garoto, no Morro da Viúva, a casa do Dr. Raul Marques de Azevedo que possuía o primeiro aparelho de alta fidelidade da cidade e a quem Tom apelidou de “Seu Vitrola”.
Billy também fez parcerias com Baden Powell, entre as quais Samba Triste, com mais de 50 gravações no exterior. Criou um estilo próprio, descrevendo com perspicácia as situações a sua volta, ora com humor (talvez sua face mais conhecida), ora no gênero exaltação, outras vezes falando de amor e desilusão.
Nos anos 50 e 60, os ídolos da época gravaram diversos sucessos seus: Dick Farney, Lúcio Alves, Elis Regina, João Gilberto, Dolores Duran (de quem foi namorado, antes dos respectivos casamentos), Silvio Caldas, Nora Ney, Jamelão, Elisete Cardoso, Dóris Monteiro, Jorge Goulart, Os Cariocas, Pery Ribeiro, Miltinho, Hebe Camargo e outros. Composições como Mocinho Bonito, Viva meu Samba e Estatutos da Gafieira tornaram-se temas ínesquecíveis. Suas canções têm sido constantemente regravadas por nomes como Maria Bethânia, Emílio Santiago e Zé Renato, além de serem utilizadas em trilhas de comerciais e novelas. A mais recente foi Desencanto, parceria com Sebastião Tapajós, um dos temas da novela da Globo, Uma história de amor, na voz de Ana Lemgruber.
Quando Billy Blanco apareceu, foi comparado a Noel Rosa pela graça com que fazia crônicas musicais do Rio de Janeiro. Ele, que nos descreveu tantos personagens, também se fez uma figura do Rio; anda sempre de branco, em respeito ao próprio nome, com bigodão e rabo-de-cavalo, por Copacabana, onde faz suas caminhadas matinais, puxa papo, conta piadas e é cavalheiro. A impressão que se tem é que ele, depois de criar três filhos e um nome respeitável na arquitetura e na música, não se leva muito a sério; ri das próprias mazelas da idade.
É considerado um dos precursores da Bossa Nova, pois suas canções já eram leves numa época onde reinava a dor-de-cotovelo do samba-canção. Sobre este ponto é necessário falar da Sinfonia do Rio de Janeiro – Suíte Popular em Ritmo de Samba. Composta por Billy e Tom, ambos criando letra e música, a partir de uma sugestão de Billy que, ao se deparar com a visão da Cidade Maravilhosa, de dentro de um lotação, pensou alto o tema: “Rio de Janeiro, que eu sempre hei de amar, Rio de Janeiro a montanha, sol o mar!” Na Sinfonia, o samba foi tratado como status de música erudita, antecipando o rigor camerístico com que João Gilberto abordaria o samba anos depois. Destacou-se, entre outros, o trecho Descendo o Morro, de moderna melodia cromática, e a A Montanha/O Morro, onde os dois doutores do asfalto reverenciam o samba de gente simples da favela.
Com côro, orquestra (arranjada por Radamés Gnatalli) e elenco de estrelas da voz, a Sinfonia foi um ambicioso projeto de dois jovens que, depois de longa peregrinação pelas gravadoras, conseguiram realizá-la pela Sinter em acordo com a Continental.
Era muito difícil conseguir espaço num meio onde reinavam Ary Barroso, Caymmi e Ataulfo Alves. Íam para os corredores das rádios, de violão na mão, para tentar mostrar as músicas para os artistas. Mas a Sinfonia surtiu o efeito desejado: pouco tempo depois do lançamento, todos do meio musical perguntavam quem eram aqueles dois talentosos rapazes.
Conta Carlos Lyra que Billy o ajudava com dicas e correções em suas músicas, quando o autor era ainda um menino. Ambos eram muito amigos de Tom. Billy diz: “Naquela época, todos nós dávamos sugestões uns aos outros”. Conta uma curiosidade: quando João Gilberto foi chamado para tocar no Carnegie Hall, não tinha violão e ninguém se arriscava a emprestar um a ele. Mesmo não indo, Billy ofereceu o seu, João aceitou, tocou em Nova York e foi aquele sucesso todo. João voltou, devolveu o pinho, e de alguma forma retribuiu, anos depois, gravando a bela Esperança Perdida.
Billy Blanco domina completamente a arte de compor. Doutor paraense que se fez bamba no samba carioca, envereda pela bossa, pelo carimbo, pela toada. Tem gosto especial em compor suítes populares em homenagem a cidades. Além da Sinfonia do Rio de Janeiro, fez sozinho a Guajará, suíte de- Arco-Íris, para Belém, com arranjos de Gilson Peranzetta – interpretada por Leila Pinheiro, Pery Ribeiro, Lucinha Bastos, MPB4 e Quarteto em Cy e Paulistana, Retrato de uma Cidade.
A Paulistana, concluída em 1974, trabalhada durante dez anos, consiste em quinze músicas, que foram cantadas por Elza Soares, Pery Ribeiro, Cláudia, Claudete Soares, Nadinho da Ilha, Coro do Teatro Municipal e Miltinho. Produzida por Aloysio de Oliveira e orquestrada pelo maestro Chico de Moraes, destaca-se na Paulistana o carimbó-épico Monções, e a original fusão bossa-pop em O Tempo e a Hora, cujo refrão retrata a correria do dia-a-dia das cidades: “Vambora, vambora, olha a hora ! Vambora !” Billy trabalha no momento em mais uma homenagem: As Alagoas.
O velho coração de Billy sofreu um enfarte em 95, que o levou “às portas do céu”, como ele conta na bem-humorada Canta Coração. Foi recusado na entrada por que esqueceu o “passaporte carimbado” e voltou para fazer mais “uns sambas pro povo”. E tem feito bastante coisa: 56 parcerias com o violonista Sebastião Tapajós e outras tantas sozinho ou com outros parceiros, num total de 500 músicas, 300 das quais já gravadas.
Em novembro passado, foi homenageado com uma grande noite no Teatro Rival, por ocasião do lançamento do CD Tributo a Billy Blanco, pela Leblon Records, no projeto A Grande Chance idealizado pelo radialista José Messias, reunindo dez canções de Billy: Tributo foi cuidadosamente produzido pór Ana Duarte, esposa de seu grande amigo Pery Ribeiro.
Em 96, Billy lançou o livro Tirando de Letra e Música, pela editora Record, já na 2a. edição. Misto de autobiografia, livro de letras e songbook, com casos, curiosidades e um pouco da estória da MPB. Também é de 96 seu mais recente CD: Billy Blanco Informal, gravado ao vivo no Vinícius Bar, com arranjos de Célia Vaz, pela gravadora CID.
Em 1964, por ocasião do arquivamento da democracia e suas liberdades no país, regime de recessão que proporcionou a vários intelectuais uma temporada de veraneio nos quartéis e no exterior, Billy, depois de pagar sua cota de inteligência reprimida, foi para Nova Iorque por sessenta dias em companhia do então governador do Rio de Janeiro, Dr. Carlos Lacerda (que logo seria também execrado pelo regime), a fim de traduzirem a peça “How to succeed in business without really trying”, que virou no Brasil “Como vencer na vida sem fazer força”. Foi Alfredo Machado, então presidente da Editora Record, que iria produzir com Oscar Ornstein a peça no Brasil, quem mandou Billy para os EUA com a incumbência de assistir quantas vezes fossem necessárias a peça, para se concretizar a adaptação ( não simplesmente a versão) das 18 músicas da peça. Os diálogos estavam a cargo de Carlos Lacerda.
Em seguida foi feito o mesmo processo para “Sound of Music” que tomou no Brasil o título de “Música, Divina Música”, esta em parceria coma Marise Murray. Escreveu para cinema e teatro, destacando-se o musical ‘Chico do Pasmado” com Aurimar Rocha – “Rio de Janeiro a Janeiro” de parceria com Tom Jobim para o show de Carlos Machado na boite Night and Day. Teve músicas em vários dos famosos “Carnavais Atlântida” filmados no Rio e no filme de Hugo Christensen “Crônica da Cidade Amada”.
Seu próximo lançamento será o CD “A Bossa de Billy Blanco”, pela gravadora Biscoito Fino.
SEBASTIÃO TAPAJÓS
Conheço o Billy desde 1967 e faço questão de preservar esta amizade até sempre, pois é um ser humano maravilhoso, digno de prêmio Nobel, como compositor e autor é genial.
Tenho tido o privilégio de conviver e aprender muito com ele. O Brasil tem no Billy um dos mais importantes compositores de todos os tempos. O Billy é sinônimo de melodia, harmonia e ritmo.
Um de seus humildes parceiros,
Sebastião Tapajós
Santarém, 25 de Outubro de 2002.
Sebastião Tapajós, compositor, amigo e parceiro de Billy Blanco.
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Caro Sebastião,olá!
ReplyDeleteComo apreciadora dos vossos trabalhos musicais, admiradora e fã de voces dois, sinto-me privilegiada por ser contemporânea de tão ilustres nomes da nossa música brasileira com raízes na Amazônia, como vc e Billy.
Por certo, talentos incomparáveis.
Justíssima homenagem e belíssimo gesto.
Saúde ao nosso Billy Blanco e sucesso para vc.
Um terno abraço amazônico parauara aos dois.